Psico-Socializando por Henrique Weber
Quando a mãe sufoca o filho com o seu amor
Você já ouviu a frase que diz “ um filho e seu pai são dois; e um filho e sua mãe são um”? Então, descrever o encontro de um bebê com a sua mãe não é tarefa fácil, mas vamos pensar que é como se os dois estivessem de frente ao espelho se amando muito, um ao outro. O recém-nascido quando chega ao mundo, não reconhece o seu nome, nem tão pouco reconhece ser possuidor de mãos, pés, corpo e cabeça. Mas, ele reconhece sua mãe, como que fosse a extensão dele, ou só reconhece este amor, como sentimento pleno de estar vivo e desfrutando de um êxtase, porque esta relação foi gestada antes do parto.
Em pouco tempo, O bebê vai adquirindo uma identidade (um nome), vai integrando os seus membros como seu (amadurecimento motor), através do investimento que sua mãe faz de dar o seu afeto, de cuidar e proteger, intermediado pela linguagem. O bebê vai adquirindo autoestima, base para ele suportar as agruras do mundo. A natureza lhe empoderou com um suporte da empatia ou da fofura, pois o bebê se torna o centro da casa e da família. É o reizinho. O psicanalista Sigmund Freud chamou este fenômeno de “narcisismo”, quando o indivíduo toma a si mesmo, o próprio corpo, como objeto de amor. Isto só acontece porque a mãe projeta e reforça todas as qualidades que ela diz que ele tem, cobrindo-o de elogios, como se não existisse mais ninguém neste mundo pra dar amor, e assim, a criança vai crescendo.
Na mitologia grega, Narciso foi um jovem muito belo que era desejado por muitas jovens. Ele possuía muita soberba e não se permitia abrir-se ao outro. Buscava meios de fugir às investidas. Nada entrava nesta relação que Narciso tinha com a sua auto-imagem. Ele se amava tanto que um dia, com o rosto defronte ao lago, tentou possuir a sua imagem (espelhada). No caminho para chegar a este lago, havia uma ninfa (uma menina- divindade que ajudava os deuses) que o seguia e que era muito esperta, chamava-se Eco. Esta foi um dia castigada por Hera, deusa do matrimônio, e esposa do Grande Pai Zeus.
Quando Hera procurava por Zeus e perguntava a Eco, esta enrolava tanto com a sua lábia, para que Zeus não fosse pego no adultério. Lógico que, um dia, a deusa descobriu e jogou uma praga em Eco: esta perderia sua capacidade de falar e só poderia repetir as últimas palavras do seu interlocutor. Sendo assim, perderia a iniciativa da comunicação. Pois bem. Na nossa história, Eco ao seguir Narciso mexeu nas folhagens do caminho para o lago, e Narciso perguntou: “Aqui tem alguém?”. Eco responde “Tem alguém!”. O jovem exclama: “Então apareça, vem! E recebe como resposta um “Vem”. O mancebo começa a entrar na brincadeira e pergunta “ por que foges de mim?. Eco repete toda a pergunta... Narciso não se aguenta e solta “Vem para junto de mim, unamo-nos”, Eco responde “Unamo-nos” e salta de trás de uma árvore para abraçar o amado. O que, imediatamente, Narciso repele “ afasta-te de mim, nada de abraços, prefiro morrer do que me entregar a ti”. Eco responde “me entregar a ti” e corre para se esconder.
Parece que Eco representa esta mãe que investe tanto neste filho que é o Narciso, a ponto de tornar uma relação inebriante, hipnotizante. Chega um momento da criança que ela precisa se jogar para novas relações com pessoas que não sejam do seio familiar. Precisa se deparar com a rejeição de vez em quando, ou com a divisão da atenção (que nos tira dessa posição especial de ser o único objeto amado, o reizinho).
Parece que esta é a função dos amigos e/ou da professora da escola. Tolerar a frustração de não ter nossas necessidades imediatamente atendidas, ou de não ter alguém que nos infla o ego. Reagir a estas situações sociais é tão importante para a constituição da personalidade, da resiliência. Aos poucos, vamos conhecendo nossas limitações e nossos desejos, brota uma vontade de superar obstáculos, e nesse processo social, vamos nos conhecendo. Na fábula grega do Narciso e da Eco, havia um adivinho que era o melhor da região, seu nome era Tirésias. Ele foi consultado sobre Narciso e deu o seguinte retorno: “Narciso viveria muito tempo somente se se conhecesse”. Então, uma conclusão possível é que quem age como mimado, quem não abdica de suas vontades, perde a grande virtude de se desenvolver, de amadurecer, nesse processo que só pode acontecer com o outro.
Narciso assim que chegou ao lago e deu de cara com a sua imagem, foi ficando por ali muitos dias se enamorando, contemplando-se. Deixou de se alimentar e até de repousar, diz a fábula. Hoje, isto é parecido quando um adolescente ganha um celular. Dali em diante se inicia uma transformação. Começa a deixar as coisas que fazia antes, e vai ficando cada vez mais fixado em frente a tela a espera de likes. Começa a entrar numa obsessão que anseia a atenção dos outros através de fotos ou vídeos no Instagram, Facebook, Tik Tok e outros mais. Ou, fica viciado em jogos que foram arquitetados para não acabar, para ficar o máximo de tempo ligado, como consumidores nas telas. É perceptível a alteração do comportamento, vindo a se excluir das relações presenciais de familiares e amigos, gerando um grau de alienação que pode levá-lo ao sofrimento mental e a atos impulsivos auto-destrutivos.
A mãe precisa, em determinado momento, soltar o filho do seu ninho. A mãe acredita que ele estando no quarto, está seguro. Não só os conteúdo perniciosos que existem na internet, mas a própria compulsão é danosa. É mais do que necessário, hoje, a mãe empurrar o filho para a rua. É necessário dar este passo para ele crescer. A mãe que superprotege, repetindo as justificativas dos erros que seus filhos acometem, age que nem a Eco. Se o filho disse que “a culpa não é dele, e sim do fulano que fez isso, que fez aquilo”, ela toma isto como verdade e vai ecoar as desculpas pelos atos que o filho cometeu.
Ela não consegue enxergar as falhas e reforça o ego dele, quando era preciso cortá-lo, frustrá-lo, colocá-lo defronte ao seu erro. É uma cegueira quando uma criança incomoda todo um ambiente social, por exemplo, num restaurante, colocando no volume máximo o seu celular (joguinho, vídeo) porque ele quer que seja assim. Os pais fingem que não veem. Ou quando a mãe não deixa o filho sair de casa e viver outra experiência porque a mãe terá que desgrudar dessa parte de si mesma, o filho, com outra pessoa. Quem superprotege, desprotege, já dizia o ditado. A mãe sufoca o filho com o seu amor.
O final da nossa história é que Narciso, perdido de amor por si mesmo, tenta beijar a sua imagem no lago. Isto não o completa. Ele se agita, começa a chorar e suas lágrimas turvam as águas. Ao perder contato com a sua imagem, sente que está perdendo o seu objeto amado. Então, ele se desespera e se joga nas águas. Eco, ao ver o seu amor, sem poder falar, não pensa duas vezes e se joga também para salvá-lo ... e os dois se abraçam e vão juntos para o fundo.
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